Deficiência de vitamina D é
«uma verdadeira epidemia»
Na atualidade, a
deficiência de vitamina D constitui uma verdadeira epidemia, afeta a grande maioria
dos idosos e atinge 30% a 50% da população geral e deve-se a alterações dos
padroes demograficos, do modo de vida da maior parte das pessoas e a forma como
se trata a saude. As causas mais comuns são:
- A
redução da exposição solar
A maioria das pessoas
não trabalha nem vive ao ar livre, as crianças vivem muitas horas nas escolas e
dentro de casa, os idosos são
institucionalizados em lares em domicilios sem contacto com o ar livre e ainda
alterações ao nível do uso de vestuário, entre outras.
- O
uso crescente de protetores solares com filtros UVB
São geralmente
utilizados como medida de prevenção do envelhecimento cutâneo e do cancro de
pele. Os protetores solares com um FPS de 10, 20 e 30 reduzem, respetivamente,
em média, 90%, 95% e 98% da radiação UVB.
- O
aumento das situações que alteram a absorção, o metabolismo e a
biodisponibilidade da vitamina D
Estas mudanças
prendem-se com a obesidade (o tecido adiposo capta e fixa vitamina D), a
insuficiência hepática e renal, a toma de medicamentos, situações de má
absorção gastro-intestinal, a toma de laxantes, entre outras.
- O
envelhecimento da população
Esta situação gera uma menor
capacidade de síntese cutânea de vitamina D nos idosos.
-
Mudanças do padrão alimentar
A ingestão de mais carne e de
menos peixe é outra das causas.
A vitamina que não o é
Para se compreender
melhor esta situação, é necessário saber um pouco mais sobre a própria vitamina
D, que pertence ao grupo das vitaminas lipossolúveis (que se dissolvem em
gordura). Logo aqui surge um problema de nomenclatura, porque a vitamina D não
é uma vitamina, mas sim uma hormona esteroide, embora continue a designar-se
como vitamina por razões nutricionais e de saúde pública. Por definição,
vitaminas são substâncias reguladoras do metabolismo, requeridas em pequenas
quantidades, e que não podem ser produzidas pelo nosso organismo.
Como a vitamina D pode
ser produzida na nossa pele, por acção dos raios solares, ela não é, tecnicamente,
uma vitamina. Existem duas formas químicas principais da vitamina D. Uma
delas é a vitamina D2 (ergocalciferol). De origem vegetal, é obtida pela
irradiação ultravioleta B (UVB) do ergosterol. A outra é a vitamina D3
(colecalciferol), de origem animal, obtida pela irradiação UVB do
7-dihidrocolesterol.
Enquanto os raios UVA
têm uma intensidade constante, a radiação ultravioleta B (UVB) varia de
intensidade ao longo do dia e do ano (é tanto maior quanto mais alto esteja o
sol) e com as condições atmosféricas (é tanto maior quanto maior for o buraco
de ozono e tanto menor quanto mais nuvens encobrirem o sol). Por outro
lado, a radiação UV (A e B), quando em excesso, provoca queimaduras solares
(escaldões), foto-alergias, envelhecimento cutâneo e cancro da pele. Segundo a
Organização Mundial de Saúde (OMS), os níveis de radiação UV classificam-se em
baixos (0 a 2), moderados (3 a 5), altos (6 e 7), muito altos (8 a 10) e
extremos (11 a 14).
Quanto maior o índice
UV, maior é a produção cutânea de vitamina D mas também são maiores os efeitos
nocivos do sol. Como a produção cutânea de vitamina D só ocorre quando o índice
UV é superior a 3, existe uma margem muito estreita entre os efeitos benéficos
e os efeitos prejudiciais do sol.
Ir
para a praia sem protetor solar para conseguir mais vitamina D
É necessário que cada
pessoa, individualmente, tenha em linha de conta o seu tipo de pele (quanto
mais clara for, mais vitamina D produz, mas mais depressa se escalda) e o nível
de radiação UV a que vai estar exposta (alguns boletins meteorológicos
apresentam a previsão horária desse nível) e adopte uma estratégia adequada de
exposição ao sol que lhe permita obter o máximo de proveito com o mínimo de
risco. Portugal é um país de sol mas não é tropical, pelo que, para efeitos de
produção cutânea de vitamina D, a exposição solar durante os meses de inverno é
pouco útil, uma vez que o sol tem pouca altura.
Para se conseguir uma
produção adequada de vitamina D é necessário, na primavera, no verão e no
outono, um tempo de exposição solar, sem protetor, de 15 a 30 minutos (conforme
o tipo de pele), pelo menos três a quatro vezes por semana, nas horas em que o
nível de radiação UV seja de 4 ou 5. Uma estratégia possível é aplicar o
protetor solar apenas à chegada à praia e aproveitar os minutos que ele demora
a actuar para produzir vitamina D. Mesmo que, nesse período do ano, se produza
mais vitamina D do que o necessário para o dia a dia, o excedente armazena-se
no fígado e em outros tecidos gordos do corpo e pode ser utilizado mais tarde.
A vitamina D pode
ainda ser obtida a partir da dieta, sobretudo a partir de peixes gordos, leite
e derivados, ovos, iscas de fígado (D3), cogumelos e leveduras (D2). Em termos
gerais, e em condições ideais de vida, entre 80 a 90% da vitamina D deveria
provir da síntese cutânea (D3) e 10 a 20% da dieta (D2 e D3). No entanto,
é difícil compensar com a alimentação as muitas deficiências da produção
cutânea de vitamina D, pelo que é frequentemente necessário recorrer a
suplementos de vitamina D (alimentares e medicamentosos). Quanto aos
suplementos alimentares, o mais conhecido (e o mais potente) é o óleo de fígado
de bacalhau, que agora já se apresenta em cápsulas, de modo a evitar o seu mau
paladar.
As
doses de suplementação de vitamina D
Na actualidade é prática
corrente a adição de vitamina D a muitos produtos alimentares, nomeadamente
leite, iogurtes, farinhas e sumos de fruta.
Quanto
aos medicamentos, existem inúmeras formas de apresentação e diferentes doses,
que podem ser adquiridos em farmácias, devendo sempre consultar-se um
profissional de saúde (médico ou farmacêutico) antes de se iniciar a sua toma.
Recentemente, foram
aprovados medicamentos mais práticos, que concentram num único comprimido doses
elevadas de vitamina D3, permitindo a sua toma em esquemas mensais, o que pode
ser uma grande vantagem para os idosos, que em geral já tomam muitos
medicamentos todos os dias. Em geral, as doses dos suplementos e dos
medicamentos são apresentados em UI (Unidades Internacionais) de vitamina D,
mas alguns produtos são apresentados em microgramas. Para evitar confusões
e erros de dosagem, deve usar-se a fórmula de conversão 1 micrograma = 40 UI.
O metabolismo da
vitamina D é complexo, mas pode ser resumido de uma forma simples. As vitaminas
D2 e D3 (ergocalciferol e colecalciferol) são biologicamente inativas,
precisando de ser transformadas, primeiro no fígado, em 25-hidroxivitamina D
(calcidiol), e depois no rim, em 1.25-dihidroxivitamina D (calcitriol). O
calcidiol é a principal forma circulante, mas o calcitriol é biológicamente
mais potente (interage mais ativamente com o receptor nuclear da vitamina D,
presente na maioria das células do nosso organismo). Para além do rim,
muitos outros órgãos podem produzir calcitriol, sendo esta produção local
responsável pela regulação de cerca de 200 genes.
Os efeitos biológicos da Vitamina D
Os
efeitos biológicos da vitamina D exercem sobre o metabolismo fosfo-cálcico e a
promoção da formação óssea (prevenção do raquitismo, da osteomalacia, da
osteoporose e das fraturas)
Outros efeitos biológicos da
vitamina D
A Vitamina D exerce outros
efeitos, que se designam por efeitos pleiotrópicos, nomeadamente uma ação
anti-oncogénica (prevenção de alguns tipos de cancro), uma ação
anti-infecciosa, uma ação anti-envelhecimento e uma ação anti-inflamatória
(reduz o risco de doenças auto-imunes, como a esclerose múltipla, a artrite
reumatoide e a poliartrite inflamatória)
A
essas, acresce um efeito protetor cardio-vascular (reduz o risco de enfarte, de
doença coronária e de insuficiência cardíaca), um efeito preventivo da diabetes
mellitus e da obesidade (melhora a produção e a sensibilidade à insulina), uma
ação neuro-protectora (promove a maturação do sistema nervoso central, melhora
o tónus muscular e o equilíbrio e reduz o risco de quedas, de défice cognitivo
e de demência) e ainda um efeito protetor na gravidez (menor risco de eclampsia
e de baixo peso ao nascer).
Quais as consequências de niveis
insuficientes de Vitamina D
As
pessoas que apresentam níveis baixos de vitamina D não beneficiam destes
efeitos protetores e têm maior risco de sofrer dos problemas de saúde indicados
atrás. No entanto, a maior parte das pessoas que têm deficiência de vitamina D
não tem queixas específicas, a não ser que essa deficiência seja muito
acentuada e provoque problemas cardíacos (arritmias e insuficiência cardíaca),
problemas neurológicos (tetania e convulsões) e alterações na formação dos
ossos (raquitismo, nas crianças, e osteomalacia e osteoporose, nos adultos).
Na maioria dos casos,
as queixas são pouco concretas e incluem fraqueza muscular, cãibras, alterações
da sensibilidade, dores inespecíficas, cansaço, falta de equilíbrio, maior
propensão para infecções, quedas e fracturas, pele seca e unhas quebradiças,
entre outras manifestações. É, por isso, muito importante identificar as
situações de deficiência de vitamina D, e para isso tem de dosear a vitamina
D. O nível sérico de 25-hidroxivitamina D (calcidiol) é o melhor indicador
do conteúdo corporal de vitamina D, ao refletir a vitamina obtida a partir da
dieta, da síntese cutânea e da conversão a partir dos depósitos hepáticos.
A sua determinação é
fácil e rápida e faz-se através de uma análise ao sangue, sendo os resultados
apresentados em ng/ml (nanogramas por mililitro). Ainda não existe unanimidade
quanto aos níveis corretos de vitamina D. Algumas sociedades científicas
consideram haver deficiência com valores inferiores a 12 ng/ml de calcidiol,
carência entre 12 e 20 ng/ml e valores adequados (suficiência) acima de 20
ng/ml, enquanto outras consideram haver deficiência com valores inferiores a 20
ng/ml, carência entre 20 e 29 ng/ml e valores adequados (suficiência) entre 30
e 100 ng/ml.
Os
níveis mínimos normais de vitamina D
Do ponto de vista técnico,
os níveis mínimos normais de vitamina D são aqueles que permitem optimizar a
absorção de cálcio, manter níveis de hormona paratiroideia reduzidos e produzir
o maior benefício para o osso e a função muscular, o que se consegue com
valores que vão de 20 a 30 ng/ml, conforme as diferentes pessoas. É
precisamente para compensar esta variabilidade que se deve ter como objetivo
atingir valores superiores a 30 ng/ml de 25-hidroxivitamina D.
Por outro lado, os
níveis séricos ideais de vitamina D são aqueles que permitem produzir os
maiores benefícios pleiotrópicos na saúde. Esses níveis também variam de pessoa
para pessoa e devem estar compreendidos entre os 50 e os 80 ng/ml de
25-hidroxivitamina D.
Quem deve ter a monitorização regular dos niveis de Vitamina D
A lista
inclui grávidas, lactantes, mulheres pós-menopáusicas, obesos, pessoas com
síndromes de má absorção, doentes sob medicação que interfira com a vitamina D,
doentes com osteoporose e pessoas com história de quedas frequentes e/ou com
fracturas patológicas. Todas as pessoas que tenham níveis baixos de vitamina D
(inferiores a 30 ng/ml de 25-hidroxivitamina D) devem ser tratadas por um
médico, podendo ser necessárias doses altas, da ordem dos milhares de UI/dia.
As
soluções terapêuticas
Pode optar-se por
esquemas terapêuticos orais, diários ou semanais, com vitamina D2
(ergocalciferol) ou D3 (colecalciferol), mas esta última é preferível porque
garante níveis séricos mais elevados a médio e longo prazo. Após atingir os
valores-alvo desejados (superiores a 30 ng/ml de 25-hidroxivitaminaD), deve
fazer-se esquemas de terapêutica de manutenção prolongados, que variam entre
400 UI/dia para os lactentes e 800 UI/dia para os idosos. Nos obesos, nos
doentes que tomam medicamentos que interferem com a vitamina D e nos que têm
situações de má absorção gastro-intestinal, as doses terapêuticas e de
manutenção da vitamina D devem ser duplas ou mesmo triplas das usadas na
população geral.
Apesar do risco de
efeitos tóxicos da vitamina D ser muito reduzido, uma vez que é preciso tomar
doses muito altas, durante muito tempo, para chegar a níveis tóxicos, não é
aconselhável fazer automedicação sem controlo, pelo menos em doses elevadas.
Como conclusão pode dizer-se que a deficiência de vitamina D existe e que tem
uma elevada prevalência mas também podemos afirmar que é fácil de identificar e
é fácil de tratar.
Fonte:AquaLab
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